Milhares de roteiristas de cinema e televisão entram em greve em Hollywood, na Califórnia (EUA), a partir desta terça-feira (02). Isso coloca o distrito em turbulência, enquanto setor de entretenimento enfrenta mudanças sísmicas desencadeadas pelo boom global das plataformas de streaming.
O WGA (sigla em inglês para “Sindicato de Roteiristas dos EUA”, em tradução livre) convocou sua primeira paralisação de trabalho em 15 anos, após não chegar a um acordo para salários mais altos com estúdios como Walt Disney e Netflix. A última greve durou 100 dias e custou à economia da Califórnia mais de US$ 2 bilhões (R$ 10 bilhões na cotação atual, aproximadamente).
“O comportamento das empresas criou uma economia de jobs [trabalhos pontuais de curta duração] dentro de uma força de trabalho sindicalizada e sua postura inflexível nesta negociação traiu o compromisso de não desvalorizar ainda mais a profissão de escritor.”
--Sindicato de Roteiristas dos EUA, em comunicado
A greve
Última greve do WGA, entre 2007 e 2008, custou US$ 2 bilhões à economia da Califórnia (Imagem: Michael Buckner/PMG)
O WGA representa cerca de 11,5 mil escritores em Nova York, Los Angeles e outros lugares. Membros estavam programados para começar a erguer seus piquetes fora dos estúdios de Hollywood a partir da tarde desta terça.
A AMPTP (sigla em inglês para “Aliança de Produtores de Cinema e Televisão”, em tradução livre), que representa os estúdios, disse, na noite de segunda-feira (1º) que ofereceu “aumentos generosos na compensação” aos roteiristas. Mas os dois lados não conseguiram chegar a um acordo.
As empresas de mídia enfrentam cenário econômico difícil. Conglomerados estão sob pressão de Wall Street para tornar seus serviços de streaming lucrativos, após investirem bilhões de dólares em programação para atrair assinantes.
Aumento do streaming levou ao declínio da receita de anúncios de televisão, à medida que o público da TV tradicional encolhe e anunciantes vão para outro lugar. Além disso, a ameaça de uma recessão na maior economia do mundo também se aproxima.
A última greve do WGA, entre 2007 e 2008, custou à economia da Califórnia cerca de US$ 2,1 bilhões (R$ 10,5 bilhões). Isso porque produções foram encerradas e roteiristas, atores e produtores ficaram desempregados, para cortar gastos.
Contexto
Roteiristas de Hollywood alegam que sofreram financeiramente durante boom das plataformas de streaming (Imagem: raindog808/Flickr)
Os produtores estavam preparados para aumentar suas ofertas de salários mais altos, disse a AMPTP. Mas “não estavam dispostos a fazê-lo por causa da magnitude de outras propostas ainda sobre a mesa nas quais o sindicato continua insistindo”.
Os principais pontos de discórdia, segundo a Aliança, eram propostas que “exigiriam que uma empresa contratasse um certo número de escritores para um programa por um período de tempo especificado, seja necessário ou não”.
Já o sindicato alegou que as respostas dos estúdios às suas propostas “foram totalmente insuficientes, dada a crise existencial que os escritores estão enfrentando”. “As empresas quebraram esse negócio. Eles tiraram muito das próprias pessoas, os escritores, que os tornaram ricos”, acrescentou.
Escritores dizem que sofreram financeiramente durante o boom do streaming de TV, em parte devido a temporadas mais curtas e pagamentos menores.
Metade dos roteiristas de séries de TV agora trabalha com salários mínimos, em comparação com um terço na temporada 2013-14, de acordo com as estatísticas do WGA. O pagamento médio para profissionais no nível mais alto de escritor/produtor caiu 4% na última década.
IA entra em cena
WGA quer salvaguardas para que IA não gere roteiros a partir do trabalho anterior de roteiristas (Imagem: Reprodução/Harvard Gazette)
A IA (inteligência artificial) é outra questão na mesa de negociações. O sindicato quer salvaguardas para impedir que estúdios usem IA para gerar novos scripts a partir do trabalho anterior dos roteiristas. Escritores também querem garantir que não sejam solicitados a reescrever rascunhos de scripts criados pela IA.
Até que conflitos sejam resolvidos, parte da programação da TV será interrompida. Programas noturnos, como “Jimmy Kimmel Live” e “The Tonight Show with Jimmy Fallon“, que usam equipes de roteiristas para escrever piadas, devem interromper imediatamente a produção.
Isso significa que novos episódios não estarão disponíveis durante horários tradicionais da TV ou nos serviços de streaming que os disponibilizam no dia seguinte.
Mais à frente, a greve pode atrasar a temporada de outono estadunidense da TV. Escrever para shows de outono normalmente começa em maio ou junho. Se a paralisação do trabalho se prolongar, redes preencherão cada vez mais suas linhas de programação com reality shows improvisados e reprises.
Uma paralisação prolongada da produção também pode ser prejudicial para as economias locais, principalmente para os trabalhadores que ajudam a apoiar as produções, como motoristas, lavanderias de fantasias, fornecedores, carpinteiros e madeireiros.
A Netflix pode estar isolada de qualquer impacto imediato, por conta do seu foco global e acesso a instalações de produção fora dos EUA.
Via: Olhar Digital