A arte é um reflexo da sociedade, por isso não é surpresa que a pandemia de COVID-19 inspire a criação de filmes, séries, quadrinhos, etc., que mostram parte do que foi (e ainda é) vivido pelo mundo em um momento tão difícil. No Brasil, um dos destaques nesse sentido é o curta animado Tamo Junto, escrito e dirigido por Pedro Conti.
Em entrevista ao NerdBunker, Conti afirma que se inspirou em um momento de dificuldade, mas também de muita união no começo da pandemia, quando pessoas começaram a se ajudar durante o isolamento social:
“Dentro de todo caos que o Brasil e o mundo passavam, foi emocionante ver o cuidado com o próximo em alguns momentos. Eu me lembro que recebi um pão de um vizinho e, dentro de tanto sofrimento, um simples gesto teve um grande impacto dentro de mim. Ver o Brasil nessa situação também me fazia questionar onde estava o Brasil que eu cresci, as pessoas na qual eu convivi minha infância e aquele senso de comunidade. O curta surgiu um pouco dessa reflexão e também como uma maneira de encontrar na arte algo para se segurar num momento tão difícil.”
Com 6 minutos de duração, o filme acompanha Dinho, um jovem que ajuda sua vizinha idosa, dona Edi, levando compras para ela durante o período de isolamento social. Entre os pontos que chamam a atenção estão o cenário tipicamente brasileiro da história, com várias paisagens reconhecíveis, e uma mudança no estilo de animação no final, que apresenta um momento quase utópico de união após tanto isolamento.
Tamo Junto mostra união de vizinhos durante isolamento
Para Conti, os momentos finais da história oferecem uma abertura para que cada pessoa complete a história, baseada em suas próprias experiências, perdas e esperanças durante o período: “A mudança de estilo de animação abre espaço para o imaginário de cada pessoa que assiste o curta. Como se nossa imaginação pudesse complementar a história do filme e relacionar os personagens com a nossa própria vida […] Não queríamos sugerir um final feliz. O curta traz esse senso de afeto, mas também fala dos traumas e marcas que todos nós carregamos e as marcas que a pandemia trouxe.”
Pandemia e mercado de animação
Cenários brasileiros em Tamo Junto
O setor de entretenimento foi um dos mais afetados pelo isolamento social, já que grande parte da produção de conteúdo é feita presencialmente. No entanto, uma das áreas que continuou à todo vapor foi exatamente a animação, já que as equipes conseguem trabalhar de suas casas e entregar os projetos de forma online.
Pedro Conti confirma essa tendência durante 2020, mas ressalta que o mercado brasileiro de animações ainda tem muito a melhorar, já que a oferta de profissionais é grande, mas a maioria encontra trabalho em outros países:
“A grande maioria dos artistas 3D estão sendo absorvidos pelo mercado internacional. O mercado brasileiro de animação 3D orbita no mercado da publicidade. Alguns estúdios de games e alguns longa-metragem estão sendo desenvolvidos mas, comparado com o mercado internacional, ainda está bastante distante. A tendência é que a área de animação cresça muito nos próximos anos, mas ainda é bastante difícil viabilizar projetos por aqui.”
Conti, que já trabalhou para empresas como Walt Disney Animation, Dreamworks, Paramount, Marvel e Guerrilla Games, explica que Tamo Junto foi feito de forma totalmente independente, com apoio de empresas de outros países: a RebusFarm da Alemanha e a Chaos group da Bulgária.
“Quem diria que para fazer um curta que se passa no bairro da Jaçanã (SP) teríamos apoio de outros países e não do Brasil. O interessante é que o mercado internacional está muito ativo. Então as perspectivas para os artistas são muito boas. Não só financeiramente, mas também com a possibilidade de trabalhar em projetos grandes mesmo estando aqui no Brasil.”
Exatamente por essa dificuldade de produzir animação no Brasil, Conti ainda não sabe se Tamo Junto terá uma continuação, mostrando novos momentos vividos pelos brasileiros na pandemia, como as reaberturas e encontros após o período de vacinação:
“A animação 3D é um trabalho muito caro e demorado, então considero que essa produção foi um pequeno milagre […] O filme mostra o potencial dos nossos artistas e acredito que, para que isso se desenvolva, precisaríamos de apoio, seja de plataforma de streamings, do governo ou de pessoas que estejam interessadas nesse tipo de projeto […] Vamos tentar continuar esse tipo de produção, mas ainda temos muitas barreiras como brasileiros dentro de um mercado Europeu e Norte Americano. Espero que a gente consiga conquistar um espaço para contar as histórias que a gente acredita.”
Nosso site usa cookies e outras tecnologias para que nós e nossos parceiros possamos lembrar de você e entender como você usa o site. Ao continuar a navegação neste site será considerado como consentimento implícito à nossa política de privacidade.