Os países que ensaiam uma cautelosa saída da quarentena
Mundo
Publicado em 17/04/2020

 

Espanha autorizou fábricas e construção civil a retomar atividades e distribuiu máscaras em serviços de transporte, mas pessoas em geral devem ficar em casa/EPA /BBC NEWS BRASIL

 

Alguns governos começam a diminuir as restrições ao trabalho e ao deslocamento, o que pode ser um alívio para cidadãos e para a economia - mas também uma aposta arriscada.

Crianças dinamarquesas de até 11 anos voltaram às escolas na Dinamarca na quarta-feira (15), na mais recente tentativa de alguns países europeus e asiáticos de retomar, aos poucos, a vida pré-pandemia do novo coronavírus.

Dinamarca permitiu que alunos de creches, pré-escolas e parte do ensino fundamental retomassem sua vida escolar presencial, desde que mantendo uma distância entre si e lavando as mãos com frequência.

Ao mesmo tempo, alguns críticos afirmaram que não estão bem definidas as diretrizes do governo a respeito de quem mais poderá voltar às escolas - caberá a cada instituição decidir quais funcionários são de alto risco e devem permanecer em casa.

 

Nesse contexto, alguns pais preferiram não mandar seus filhos à escola por enquanto, temendo que os locais se tornem um ambiente de proliferação do coronavírus.

Estima-se que 4 bilhões de pessoas no mundo estejam sob algum tipo de medida de quarentena ou lockdown (sob imposições mais rígidas), no momento em que o número confirmado de casos globais de covid-19 passa de 2 milhões.

O exemplo da Dinamarca - um dos primeiros países europeus a adotar medidas de isolamento social e onde as aulas estavam suspensas desde 12 de março - dá alento, de um lado, para os que buscam saídas para o isolamento social e a retomada da economia.

De outro, evidencia o temor de que uma segunda onda de contágio volte a assolar países que, até o momento, acreditam já ter passado pelo pico da pandemia.

 Dinamarca permitiu que algumas crianças voltassem à escola, desde que mantendo a distância e lavando as mãos/Reuters/BBC NEWS BRASIL

Além da Dinamarca, outros países implementam ou discutem medidas de flexibilização.

O primeiro a fazer isso foi a China: Wuhan, a cidade chinesa onde a pandemia surgiu, em dezembro, começou a se reabrir para o mundo em 8 de abril, depois de mais de 70 dias de quarentena, permitindo que trens, aviões e carros pudessem voltar a transitar dentro e para fora da metrópole.

Mas, para usar o transporte público, os moradores precisam apresentar um QR Code de seu celular, que mostra o seu histórico de saúde e indica quem deve ou não permanecer em isolamento. Os que recebem um sinal verde podem transitar pela cidade ou sair dela.

O relaxamento foi permitido depois de Wuhan ter passado dias sem novas infecções locais ou novas mortes. Ainda assim, autoridades continuavam a realizar testes, para monitorar um eventual retorno da doença com a retomada das atividades sociais e econômicas. Até a publicação desta reportagem, as escolas locais ainda não tinham prazo para reabrir, e as pessoas seguem sendo orientadas a manter distanciamento social em ambientes coletivos.

Algumas partes da China, como Pequim, permaneciam sob medidas de quarentena.

Ainda na Ásia, o governo da Coreia do Sul afirmou que está discutindo medidas que permitam a retomada de atividades econômicas, mas mantendo o distanciamento social.

Espanha e Itália ensaiam retomada, mas sem suspender quarentena

Dois países cujos sistemas de saúde foram devastados pela pandemia, Itália e Espanha, também deram sinal verde para uma retomada gradual de alguns serviços não essenciais, na aposta de que já superaram o pior.

A Espanha, que chegou a ter 950 mortes por dia pelo coronavírus, viu o número de mortes apresentar sinais de queda e permitiu, em 13 de abril, que setores como indústrias e a construção civil reabrissem. Para esses trabalhadores que vão voltar à ativa, o governo começou a distribuir 10 milhões de máscaras nos serviços de transporte.

Mas lojas, bares e espaços públicos continuarão fechados por enquanto. E a população continua orientada a permanecer dentro de casa, pelo menos até maio.

Na Itália, o primeiro-ministro, Giuseppe Conte, afirmou que o lockdown deve continuar até 3 de maio, mas alguns tipos de negócios, como livrarias e lojas de roupas infantis, puderam começar a abrir as portas. Fábricas, porém, seguem fechadas.

Recomendações da OMS

Por enquanto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) diz ver com preocupação as medidas que relaxem o isolamento social por pressões econômicas. O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, diz temer que isso resulte em uma "reaparição mortal" do novo coronavírus.

No dia 15 de abril, a OMS afirmou que os países que decidirem aliviar as restrições devem fazer isso em fases - dando um intervalo de pelo menos duas semanas a cada relaxamento. E, nessas duas semanas, é preciso avaliar com cuidado o risco de a epidemia voltar em cada país.

A OMS listou seis avaliações que cada país deve fazer antes de suspender o isolamento social:

- Se a transmissão da covid-19 está controlada

- Se o sistema de saúde é capaz de identificar, testar, isolar e tratar todos os pacientes e as pessoas com as quais eles tiverem entrado em contato

OMS teme que reabertura prematura das economias leve a uma "ressurgência mortal" do coronavírus, mesmo em locais onde contágio parece em queda/Getty Images/BBC NEWS BRASIL

- A capacidade dos ambientes de trabalho e demais locais em proteger as pessoas, à medida que elas retomarem suas atividades

- A capacidade de lidar com os casos importados, de pessoas que venham de fora do país

- Se os riscos de surtos estão controlados em locais sensíveis, como postos de saúde ou casas de repouso.

- Se as comunidades estão conscientes, engajadas e capazes de prevenir o contágio e adotar as medidas preventivas, que deverão passar a ser vistas como o "novo normal".

A organização afirmou que as restrições devem ser removidas "estrategicamente", e nunca todas de uma única vez. Também reforçou que isso só vale para países onde o número de casos está em queda.

E, mesmo nessas condições, regras rígidas de distanciamento social e de higiene devem continuar a vigorar no longo prazo.

O Brasil, onde a curva de infectados e mortos segue em ritmo acelerado de ascensão, não se enquadra no momento em nenhum desses critérios estabelecidos pela entidade.

Comércios não essenciais reabrindo

Além de Dinamarca, Itália e Espanha, outros países da Europa onde o contágio está em queda começaram a aliviar medidas restritivas.

Áustria também relaxou medidas, mas obrigou uso de máscaras em mercados e drogarias/BBC NEWS BRASIL

Na Alemanha - país que desde o início da pandemia foi ágil em isolar seus pacientes infectados -, a chanceler Angela Merkel se reuniu com autoridades regionais na quarta-feira (15), sob forte pressão para relaxar o lockdown.

Ficou decidido que alguns tipos de comércio não essenciais poderão reabrir as portas na semana de 20 de abril, mas as medidas de isolamento social seguirão em vigor ao menos até 3 de maio. Parte das escolas poderão retomar as atividades presenciais no dia 4, a começar pelos estudantes que têm de realizar exames nacionais.

Na Áustria e na República Tcheca, pequenos negócios foram autorizados a reabrir. Mas ambos os países tornaram obrigatório o uso de máscaras em mercados e drogarias. O governo tcheco foi além, obrigando cidadãos a usar máscaras sempre que saírem de casa.

Sem alívio

Outros países, porém, não preveem alívio nas medidas restritivas ao menos até maio.

No Reino Unido, que já passou de 13,7 mil mortos, o secretário de Relações Exteriores, Dominic Raab, que comanda o país enquanto o premiê Boris Jonhson se recupera da covid-19, afirmou na quinta-feira (16) que o lockdown continuará a vigorar por pelo menos mais três semanas, na tentativa de se evitar um segundo pico de infecções.

A percepção do governo é de que o número de casos (e de admissões hospitalizares) está se estabilizando e talvez começando a cair - e esse ganho só será mantido se o distanciamento social for mantido.

Merkel permitiu que alguns comércios não essenciais reabram a partir de 20 de abril/Reuters/BBC NEWS BRASIL

Na França, o diretor do serviço nacional de saúde, Jerome Salomon, afirmou que uma leve queda nas internações em UTIs são um "pálido raio de sol" de esperança, mas que o país ainda vai enfrentar um "alto platô" - ou seja, um número alto e constante de casos de covid-19.

O presidente francês, Emmanuel Macron, afirmou no dia 13 de abril que o lockdown no país vai ser estendido até 11 de maio e, depois disso, será feito um plano de alívio gradual das medidas restritivas. Ele ressaltou que a "a epidemia ainda não está contida" na França.

EUA: 'Gasolina no fogo'

Nos EUA, que hoje são o principal epicentro do novo coronavírus e que já tinha quase 680 mil casos confirmados de infecção até a manhã desta sexta (17), existem planos para uma reabertura gradual, mas só no mês que vem, e com muita cautela.

Em entrevista à CNN, o médico Anthony Fauci, que comanda o instituto americano de doenças alérgicas e infecciosas, afirmou esparar que as autoridades consigam, até o final de abril, avaliar se há alguns setores ou regiões que possam retomar suas atividades em maio. Mas, se a avaliação for de que isso não será possível, as medidas de isolamento continuarão.

Na quinta-feira (16), o presidente americano, Donald Trump, afirmou que cabe aos governadores decidir se reabrem as economias e atividades sociais de seus Estados antes de maio.

Alguns governadores de Estados afetados duramente pela pandemia afirmaram recentemente que só vão relaxar no isolamento quando sentirem que seus sistemas de saúde terão dado conta da pandemia.

O governador de Nova Jersey, Phil Murphy, afirmou há alguns dias que teme que reabrir a economia muito cedo seria equivalente a "jogar gasolina no fogo". O governador de Nova York, Andrew Cuomo, disse recentemente que seu Estado por enquanto não está vendo um declínio no número de casos, apenas uma estabilização.

Por: BBC NEWS BRASIL via Portal R7

 

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